Breno Caiafa¹ e Flávia Alvim Sant’Anna Addor²
- – Cirurgião Vascular, Membro titular da SBACV, Especialista em cirurgia vascular e endovascular pela SBACV, Cirurgião vascular do Hospital Miguel Couto e Hospital Central da Polícia Militar.
- – Dermatologista titular pela Sociedade Brasileira de Dermatologia, Mestre em dermatologia – FMUSP, ex-professora associada – UNISA, Diretora técnica e pesquisadora – MEDCIN Instituto da Pele.
RESUMO:
Objetivos: A IVC (insuficiência venosa crônica) é doença comum que cursa com dor e edema em membros inferiores. O uso tópico de produtos com ação antiinflamatória e venotônica auxiliam no controle destes sintomas, a partir da primeira aplicação.
Material e método: Estudo aleatorizado controlado onde pacientes com IVC aplicaram uma associação de Pycnogenol® e outros fitoextratos em um dos membros inferiores (controle considerado membro contralateral não tratado), sendo avaliadas por termografia nas pernas e pés no início do estudo, após 15 minutos, 1 e 4 horas.
Resultados: Houve redução significativa nos valores da temperatura da pele das pernas e dos pés após 15 minutos, e também das pernas após 1 hora da aplicação do Fletop® quando comparado ao grupo controle, assim como dos pés após 15 minutos de aplicação.
Conclusão: A associação de Pycnogenol® com fitoextratos de uso tópico (Fletop®) demonstrou ter efeito na microvasculatura dérmica, compatível com efeito calmante, o que proporciona redução da sensação de cansaço, dor e edema em membros inferiores.
Palavras chave: insuficiência vascular periférica; termografia; edema.
INTRODUÇÃO:
A insuficiência venosa crônica (IVC) é causada por uma deficiência do fluxo venoso em membros inferiores devido à incompetência do sistema venoso superficial e/ou profundo. Esta incapacidade leva a um regime de hipertensão venosa crônica que tardiamente leva às alterações de pele e subcutâneo, características da IVC. (1) Os sintomas mais comuns são dor, queimação em membros inferiores, assim como sensação de peso e cansaço. O sinal principal consiste no edema, que piora ao final do dia, levando progressivamente ao comprometimento trófico tecidual pelo extravasamento sanguíneo e acúmulo de hemossiderina. Por isso, o prurido também é frequente, com sinais de eczema e dificuldades de cicatrização após traumas.
Sua progressão pode ocasionar distúrbios mais graves como alteração de fâneros, hiper ou hipopigmentação da pele, lipodermatoesclerose e em última análise a formação de lesões cutâneas, chamadas de úlceras venosas ou de estase, que podem variar desde pequenas lesões até feridas de grande porte.
Esses sintomas têm potencial de afetar a qualidade de vida dos pacientes, à medida que podem interferir em seu período de lazer e sua capacidade laborativa, podendo promover um afastamento temporário ou até definitivo de sua atividade profissional.
O diagnóstico da insuficiência venosa crônica é eminentemente clínico, feito através da anamnese e do exame físico,
- podendo ser auxiliado por exames complementares, sendo o mais utilizado o Eco Doppler colorido do sistema venoso.
Medidas para auxílio do retorno venoso, como uso de meias elásticas, repouso com membros elevados e perda de peso são orientações comuns, além das medicações flebotônicas. (3)
Na tentativa de minimizar essa patologia e seus sintomas, várias substâncias vêm sendo estudadas e utilizadas em seu manejo terapêutico.
O extrato do pinheiro francês marítimo, conhecido como Pycnogenol® já vem sendo usado oralmente no tratamento da IVC, com efeitos significativos na sintomatologia desta enfermidade, além de apresentar um perfil de segurança que permite uma ampla utilização. Inclusive a partir do segundo trimestre da gestação (4, 5, 6 e7). Sua permeação cutânea está bem documentada, (8) e a segurança para uso tópico também é conhecida, já que não tem efeitos sistêmicos, sendo aprovado para uso em cosméticos na Europa e Estados Unidos. (9 e 10)
Da mesma forma extratos vegetais da Centella asiática e Castanha da Índia possuem ação venotônica tanto tópica como oralmente e já é largamente usada em produtos para melhorar a circulação venosa e na redução de edemas. (11)
A melhora da microcirculação sanguínea pode ser avaliada pela termografia, técnica que permite determinar as variações da temperatura da superfície da pele detectando aumento ou diminuição da microcirculação sanguínea. A estase sanguínea acompanhada de vasodilatação, assim como uma reação inflamatória da pele, costumam aumentar a temperatura da pele, o que pode ser evidenciado por este método. (12)
Este estudo visa avaliar uma nova opção terapêutica, de uso tópico, que consiste na associação de várias substâncias ativas comprovadamente eficazes no tratamento da desordem venosa crônica, utilizadas através loção cremosa composta por várias substâncias químicas entre as quais o pycnogenol, castanha da índia, calêndula, centella asiática e mentol.
A técnica termográfica foi empregada para avaliar o impacto do efeito refrescante e venotônico que a associação estudada oferece após uma única aplicação em membros inferiores.
MATERIAL E MÉTODO:
Este estudo foi conduzido em novembro de 2016, com duração de 1 semana, em instituição de pesquisa clínica privada. O protocolo foi aprovado por comitê de ética, sob o número de 60609016.9.0000.5514 (parecer 1.774.269). Trata-se de um estudo aleatorizado e comparativo.
Foram incluídos 30 pacientes do sexo feminino, com faixa etária média de 48 + 11 anos, com história clínica de Insuficiência Venosa Crônica (IVC), com queixa de cansaço, dor, edema e peso nas pernas e nos pés.
Após assinatura do termo de consentimento livre esclarecido, as pacientes foram avaliadas clinicamente para constatação da IVC, ausência de patologias ativas na região, gestação, uso de drogas anti-inflamatórias, imunossupressoras e vasoativas, bem como condições que dificultassem a aplicação do produto avaliado. Após 30 minutos de repouso, em ambiente controlado (24 ± 1 ºC), foram realizadas as tomadas de imagem termográficas com termocâmera Thermoview Ti25 (Fluke Corp, EUA), com os pés paralelos, a uma distância de 1,5 m. Em seguida, o produto tópico contendo extratos de Pycnogenol®, Centella asiática e Castanha da Índia (Fletop®) foi aplicado em um dos membros inferiores, de forma aleatorizada, em uma quantidade suficiente para cobrir completamente a região de avaliação, em movimentos circulares e ascendentes, de forma padronizada. Após 15 minutos, 1 e 4 horas da aplicação foram obtidas novas imagens termográficas, sob as mesmas condições.
As imagens termográficas geradas foram avaliadas utilizando o software SmartView 3.4 (Fluke Corp, EUA). Foram traçadas áreas de forma padronizada obtendo-se diretamente do software o valor de temperatura superficial da pele, na qual regiões com temperaturas mais frias são representadas em azul, passando a verde, amarelo, até vermelho, para as temperaturas mais altas. A variação média da temperatura da pele, T, está diretamente relacionada à microcirculação periférica da pele, sendo calculada conforme a Equação T = Tt0 – Tti / Tt0, onde: T = temperatura média superficial da pele; ti = após 15 minutos, 1 e 4 horas da aplicação do produto investigacional; t0 = condição inicial.
As reduções dos valores de T indicam melhora da microcirculação sanguínea.
RESULTADOS:
Ambos os grupos avaliados não apresentaram diferenças significativas dentre as características avaliadas no início do estudo quanto à temperatura de cada perna, demonstrando serem comparáveis entre si ( p> 0,05). As 30 pacientes concluíram o estudo, sem nenhum evento adverso.
O Gráfico 1 demonstra os resultados médios obtidos da temperatura média superficial da pele na região dos membros inferiores, em panturrilhas:
Gráfico 01: resultados médios obtidos da temperatura média superficial da pele na região dos membros inferiores (n=30).
Os dados foram submetidos a avaliação estatística utilizando-se o método do Teste-t de Student, bimodal, pareado, considerando-se um intervalo de confiança de 95% e demonstraram uma melhora estatisticamente significativa da perna tratada na avaliação de 15 minutos e 01 horas. (p<0,05)
A figura 01 ilustra as imagens obtidas dos membros inferiores:
Figura 01: representação das imagens termográficas obtidas nos tempos 15 minutos, 1 hora e 4 horas, onde observa-se a diferença de coloração entre a perna direita (tratada) e esquerda (controle). A redução da temperatura é observada pelo aumento das regiões de coloração amarelo- esverdeado, correspondente a temperaturas mais frias na escala colorimétrica utilizada, indicada na imagem.
As médias termográficas dos pés, tomadas a partir das áreas plantares, estão representadas no gráfico 02:
Gráfico 02: resultados médios obtidos da temperatura média superficial da pele na região dos pés (n=30).
Os dados foram submetidos a avaliação estatística utilizando-se o método do Teste-t de Student, bimodal, pareado, considerando-se um intervalo de confiança de 95% e demonstraram uma melhora estatisticamente significativa do pé tratado na avaliação em 15 minutos. (p<0,05)
A figura 02 ilustra as imagens obtidas dos pés:
Figura 02: representação das imagens termográficas obtidas nos tempos 15 minutos, 1 hora e 4 horas, onde observa-se a diferença de coloração entre a perna direita (tratada) e esquerda (controle). A redução da temperatura é observada pelo aumento das regiões de coloração amarelo- esverdeado, correspondente a temperaturas mais frias na escala colorimétrica utilizada, indicada na imagem.
DISCUSSÃO:
O uso tópico do Pycnogenol® vem sendo estudado em concentrações variadas como tratamento coadjuvante na IVC, sendo que sua absorção e biodisponibilidade por via tópica já está comprovada.(13)
Em um experimento avaliando seus efeitos anti-inflamatórios, os extratos foram aplicados em ratos, demonstrando um efeito consistente em reduzir o diâmetro de feridas assim como seu processo inflamatório, quando comparadas ao grupo controle. (14)
O Pycnogenol®, patente e marca registrada do extrato do Pinheiro Marítimo Francês, é um flavonoide padronizado para conter uma média de 70% de procianidinas, moléculas de ação anti-inflamatória e antioxidante, podendo ser usado tanto oral como topicamente. (15)
Seu mecanismo de ação decorre do relaxamento endotelial facilitado pelo óxido nitroso (NO), sendo um importante componente da função vascular. Um efeito vasorrelaxante foi demonstrado como resultado do estímulo da NO sintase endotelial na presença de Pycnogenol (16,17); um estudo clínico cego placebo-controle em pacientes com úlceras venosas, conduzido por 06 semanas, demonstrou uma redução da área ulcerada maior significativamente no grupo que
associou a aplicação tópica de pycnogenol com o uso oral em relação ao grupo que utilizou apenas Pycnogenol oral, na dose de 150mg/dia (17)
Efeitos positivos no tempo de regressão do diâmetro das lesões foram obtidos com pacientes portadores de úlcera diabética, em um estudo comparativo com 6 semanas de duração. Esta eficácia superior, segundo os autores, possivelmente estaria relacionada com a maior concentração do Pycnogenol na área, além de uma propriedade característica do Pycnogenol tópico adstringente e bacteriostática. (18)
Segundo Rohdewald (7), em 8 estudos placebo controlados duplo-cegos foi demonstrado significativa redução do edema e sintomas de peso, câimbras e dor após uso de pycnogenol em pacientes com desordem venosa crônica. Esses resultados foram comprovados pela redução da aferição de diâmetro em nível de panturrilhas, como também demonstrou Koch (19).
Aplicação tópica do pycnogenol previne significativamente a formação de eritema após exposição à radiação UV e inibe a fotocarcinogênese (9).
Os fitoextratos associados, Centella asiática e Calêndula (venotônica e anti-inflamatória, respectivamente) atuam sinergicamente, evitando assim a necessidade de concentrações muito altas de qualquer dos ativos isoladamente, conferindo portanto maior segurança de utilização em áreas cutâneas extensas, e por longos períodos.
A Centella asiática possui triterpenos, que já demonstraram efeito sob uso tópico no tecido conectivo endotelial. (20) O foco de sua ação é a atividade anticelulítica e estimulante circulatória. O efeito benéfico da Centella Asiática nos casos de celulite, está relacionada com sua capacidade de potencializar as estruturas do tecido conjuntivo com redução da esclerose, enquanto sua ação na insuficiência venosa está determinada pela combinação de efeitos sobre o tecido conjuntivo e sua capacidade de melhorar o fluxo sanguíneo nos membros afetados.
A atividade circulatória se deve à fração Triterpênica da Centella Asiática (FTTCA) demonstrando benefícios nos casos de hipertensão venosa crônica (HVC), com alteração da microcirculação em síndrome pós-flebítica, prevenção de edemas, e na microangiopatia diabética. Em todos os casos a ação sobre o endotélio estaria determinado pela maior síntese do colágeno, fibronectina e proteoglicanos (21).
Um estudo clínico farmacológico foi realizado durante um mês em 30 pacientes com HVC (15 com síndrome pós- flebítica e com antecedentes de TVP femoro-poplítea e outros 15 com insuficiência de safena interna), demonstrando benefício da fração Triterpênica total da Centella Asiática (CA) comparado com Flavonoides Diosmina e Hidroxirutosídeos, demonstrados através de estudos de capilaroscopia(22).
Em um estudo multicêntrico, duplo cego verso placebo, com 94 pacientes com IVC dos membros inferiores, foi demonstrado que o extrato tratado de Centella Asiática (TECA) em dose de 60-120 mg/dia, evidenciou benefícios clinicamente significativos em relação ao alívio sintomático medido através de provas de distensibilidade venosa e pletismografia(23). Em pacientes com síndrome pós-flebítica, a administração oral de FTTCA por 3 semanas demonstrou diminuição do número de células endoteliais circulantes em relação ao grupo controle(24).
A Calêndula é composta de Flavonóides (em especial a quercetina3-0glicosídio), óleo essencial, polissacarídeos, alcoóis pentacíclicos e outros. Sua ação farmacológica mais difundida é a atividade reepitelizante e cicatrizante cuja atividade é exercida sobre o metabolismo das glicoproteínas, nucleoproteínas e tecido colágeno. Os triterpenos, principalmente o helianol, apresentam importante atividade anti-inflamatória e estimula a granulocitose e fagocitose, auxiliando o combate a infecção. O creme de Calêndula leva a aceleração da cicatrização cutânea promovendo a
reparação mais eficiente do tecido. O ácido oleanóico possui ação calmante e refrescante para pele sensível, favorece a regeneração dos tecidos e exerce atividade antisséptica. Os flavonóides reforçam a ação cicatrizante (25).
A Castanha da índia, usada largamente no tratamento de sinais e sintomas de insuficiência vascular periférica, flebites e fragilidade capilar, tem capacidade de reduzir a tensão venosa, devido a presença da b-escina; esta molécula favorece o transporte de íons nos canais de cálcio, regulando os tônus da parede venosa. Outro mecanismo de ação proposto é a liberação de prostaglandina F2a das veias, antagonista da serotonina e histamina (26)
Um estudo clínico prospectivo desta associação em monoterapia foi conduzido em 46 pacientes, gestantes e não gestantes; os resultados após 4 semanas de uso apontou melhora significativa estatisticamente dos sinais e sintomas da insuficiência venosa crônica leve a moderada, sem registro de reações adversas (27)
A termografia aqui utilizada demonstrou uma melhora da vasodilatação, justificando o alívio quase imediato do desconforto ocasionado pelo edema e sensação de peso em membros inferiores. (11)
CONCLUSÃO:
A associação de fitoextratos com Pycnogenol® em uso tópico (Fletop®) demonstrou a capacidade de reduzir significativamente os valores de temperatura cutânea dos membros inferiores após 15 minutos e 1 hora da aplicação quando comparado ao grupo controle; da mesma forma, houve redução significativa nos valores de temperatura dos pés após 15 minutos. Estes achados estão relacionados com redução do edema e com a melhora da sensação de cansaço e dores nas pernas. Trata-se, portanto, de uma opção no arsenal terapêutico do tratamento coadjuvante dessa enfermidade, no sentido de minimizar seus sintomas, auxiliando a promover uma melhora na qualidade de vida desses pacientes.
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