Educação em saúde e doença venosa crônica (DVC)

Autores:

Rafael Alexandre de Menezes Ramos da Silva, aluno de graduação de Medicina, Unirio Bernardo Cunha Senra Barros, professor de Cirurgia Vascular, Unirio

Stenio Karlos Alvim Fiorelli, professor de Cirurgia Vascular, Unirio Marcos Arêas Marques, médico do Serviço de Cirurgia Vascular, Unirio Antônio Macedo D’acri, professor de Dermatologia, Unirio

Rossano Kepler Alvim Fiorelli, Academia Nacional de Medicina

INTRODUÇÃO

A Constituição brasileira de 1988 estabeleceu que a saúde é direito de todo cidadão, sendo papel do Estado promovê- la1. A promoção em saúde envolve aspectos que vão além dos atos técnicos, englobando ações que promovam um maior engajamento do paciente quanto a seu próprio bem-estar. Sob essa base, a presente pesquisa foi construída seguindo sobretudo o princípio da integralidade, no que tange seu aspecto de prevenção, e do direito à informação do indivíduo sobre sua saúde2.

Considerando essa reflexão a respeito de educação e saúde, propomos a criação de uma cartilha sobre a DVC para ser entregue aos voluntários. Elaboramos também um questionário que avaliava o conhecimento sobre a DVC antes e após a leitura da cartilha, de modo a determinar se foi um método eficaz de ensino no contexto local de saúde.

A relevância desta publicação é amplificada pela prevalência da DVC no Brasil, estimada em 47,6% da população adulta3, representando grande fonte de morbidade e de impacto socioeconômico no Sistema Único de Saúde (SUS). A fila para tratamento de varizes em estágios avançados no sistema de regulação de vagas do município do Rio de Janeiro chegava a 3.700 pacientes em 20184, número que poderia ser menor caso houvesse um esforço no sentido da prevenção primária e terciária desta doença.

Outro alicerce deste artigo, a educação em saúde, tem origem menos precisa, porém, um marco moderno de sua relevância se deu a partir da Carta de Ottawa, de 19865, que estabeleceu a saúde como um meio para uma vida plena e não um objetivo por si só. Desse modo, apresentou para a sociedade a visão de promoção em saúde que visa engajar a população para um autocuidado, buscando diminuir as lacunas entre os estratos sociais e a negligência política acerca da área da saúde. Nesse contexto, a informação sobre as doenças e como evitá-las assume papel fundamental, permitindo que o paciente identifique suas vulnerabilidades e promova uma intervenção sobre as mesmas, sendo este o verdadeiro objetivo do ato educacional na área da saúde6.

O paciente educado, que compreende sua condição de saúde para além do que sente, possui maior adesão à terapêutica proposta, fato apontado principalmente para pesquisas relacionadas à hipertensão arterial sistêmica e diabetes mellitus, que podem ser comparadas à DVC por sua cronicidade e alta prevalência7.

A presente publicação mostra sua relevância não apenas por seu papel educacional do paciente, mas pela carência de fontes científicas acerca da educação terapêutica no contexto da DVC no Brasil8.

Objetivos

O objetivo deste trabalho é avaliar se o conhecimento de pacientes acerca da DVC depois da leitura da cartilha melhorou. Isso foi feito a partir de questionários elaborados em pesquisas prévias e referendados por especialistas na área. Em paralelo, por meio da análise qualitativa e quantitativa dos dados coletados, determinar os principais fatores de confusão dentre os portadores de DVC e propiciar um melhor entendimento de profissionais da saúde sobre as dificuldades e anseios de pacientes que tenham essa doença, de forma a permitir um melhor cuidado em saúde.

METODOLOGIA

Revisão Bibliográfica

A revisão bibliográfica específica para o tema foi feita considerando arquivos dos últimos dez anos, tal amplitude de tempo é justificada pela escassez de artigos científicos abordando educação terapêutica no contexto da DVC.

As palavras-chave foram pesquisadas em português e em suas traduções correspondentes para o inglês. Para seleção dos descritores, foi utilizado o portal de descritores em ciências da saúde da Biblioteca Virtual em Saúde Brasil (BVS). As bases de dados Pubmed, Scielo e BVS foram a fonte dos artigos encontrados, e apenas publicações em português e inglês foram incluídas.

Os descritores utilizados foram os seguintes: “insuficiência venosa”, “educação de pacientes como assunto”, “veias varicosas” e “conhecimento”.

No portal Pubmed com o uso dos descritores “venous insufficiency OR varicose veins AND patient education as a topic”, foram encontrados nove artigos que se enquadram no tema em estudo, porém dois foram excluídos por apresentarem o texto em alemão.

No portal Scielo, apenas um artigo demonstrou utilidade para a presente pesquisa após a avaliação de seu conteúdo quando os descritores foram “doença venosa” e “conhecimento”.

No portal BVS, apenas dois artigos se mostraram adequados para a presente publicação usando os descritores “insuficiência venosa” e “educação do paciente”, porém apresentaram sobreposição com referências encontradas na

plataforma Pubmed.

Parte das referências específicas para DVC e educação terapêutica foi encontrada ao longo do estudo de outros artigos. As demais publicações utilizadas para desenvolvimento deste trabalho foram encontradas nas mesmas bases de dados anteriormente citadas.

Coleta de dados

O recrutamento de pacientes foi realizado no ambulatório de Cirurgia Vascular do Hospital Universitário Gaffrée e Guinle (HUGG). O paciente era introduzido de forma verbal ao projeto de pesquisa e, caso aceitassem participar, recebiam um termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) com orientações acerca da pesquisa e uma cartilha (apêndice A), contendo capa e duas páginas com textos e imagens explicando sobre diversos tópicos da DVC e um QR code que continha material extra, no qual o paciente poderia aprender mais sobre as fases da doença. A cartilha foi confeccionada a partir de modelos de material semelhante de outras instituições, com adaptações à realidade brasileira e referendada por especialistas da área.

Após receber o material e assinar o TCLE, foram realizadas nove perguntas sobre a DVC para avaliar o conhecimento dos pacientes sobre o tema, sendo que cada uma das perguntas representou um critério na análise estatística (Tabela 1). As perguntas variam por áreas específicas da DVC e também sobre noções gerais acerca do manejo de doenças crônicas, e continham parâmetros preestabelecidos como respostas adequadas (Apêndice B). Esse questionário foi baseado em uma pesquisa que buscava criar perguntas para estratificar o conhecimento de pacientes portadores de úlcera venosa acerca de sua própria condição de saúde9.

Tabela 1. Critérios analisados e suas respectivas indagações

Critério 1Conhecimento sobre os fatores de risco para DVC
Critério 2Conhecimento sobre os sinais e sintomas da DVC
Critério 3Conhecimento sobre os benefícios do tratamento adequado da DVC
Critério 4Conhecimentos sobre como prevenir a DVC e suas complicações
  Critério 5Conhecimento sobre como otimizar o tempo de atividade e repouso de modo a atenuar a DVC
  Critério 6Conhecimento sobre as medidas farmacológicas e não farmacológicas para controle da dor
Critério 7Conhecimento sobre as medidas de rotina no tratamento da DVC
Critério 8Conhecimento sobre o seu papel no tratamento e prevenção
Critério 9Conhecimento sobre os recursos necessários para prevenção e tratamento

A resposta dos pacientes era anotada e depois comparada aos parâmetros que respondiam à pergunta e estavam previamente estabelecidos. A quantidade de respostas consideradas como corretas era associada a uma pontuação numérica estabelecida por meio da escala de Likert14 de cinco variáveis. Nessa escala, o número “1” era inicial para todos os conceitos abordados, podendo chegar à pontuação “5” o paciente que mencionasse ao menos quatro tópicos que respondessem corretamente à pergunta. Após aproximadamente um mês, na mesma data da consulta de retorno ao ambulatório, eram realizadas as mesmas nove perguntas. Esse resultado era comparado com o pré-cartilha e o entrevistador deixava o recrutado livre para esclarecer qualquer dúvida que tivessem sobre a DVC.

Análise estatística de dados

Os dados obtidos por meio do recrutamento de voluntários foram passados manualmente das folhas espelho com as respostas dos pacientes para uma planilha de Excel® (Microsoft®), já transformados em valores numéricos obtidos pela escala de Likert.

Após compilar os dados via Excel®, essa planilha foi exportada para o programa de estatística R, a análise de dados iniciou por meio da função summary que permitiu calcular os valores de média, mediana e quartis de distribuição

que serão apresentados a seguir. Para avaliar a forma com que os dados estavam distribuídos, foi utilizado o teste de normalidade de Shapiro-Wilk, essa definição era importante para determinar qual teste deveria ser utilizado para analisar os dados obtidos10.

Com o resultado do teste de Shapiro-Wilk, foi determinado que o teste-t pareado era o mais apropriado para o exame da amostra14, considerando que eram valores que correspondiam a um indivíduo que respondeu às perguntas antes e depois da cartilha. Desse modo, foi utilizado esse método para determinar a relevância estatística de cada uma das dez variáveis analisadas.

RESULTADOS

Trinta e três pacientes participaram da pesquisa, todos receberam a cartilha e foram questionados sobre o conhecimento prévio sobre a DVC. Dentre os participantes, 15 retornaram e foram novamente entrevistados após a legação de terem lido a cartilha; cinco pacientes disseram não ter lido o material; e 13 pacientes perderam seu seguimento na pesquisa, todos por terem faltado à consulta de retorno, cerca de um mês após terem aceitado participar. Dessa forma, 18 participantes foram excluídos da análise de dados.

Dentre os 33 entrevistados, 23 eram do sexo feminino e 10 do sexo masculino. Considerando uma análise por segmento, dois dentre os 15 participantes que estiveram nas duas fases da pesquisa eram do sexo masculino, todos que alegadamente não leram o material eram do sexo feminino e oito dentre os 13 que representam uma perda de segmento eram do sexo masculino.

É relevante destacar que todos os pacientes recrutados para a presente pesquisa possuíam alguma evidência clínica de DVC, porém não foram estratificados quanto à sua gravidade. A pergunta principal deste artigo era sobre a capacidade da cartilha de ampliar o conhecimento dos pacientes sobre a DVC.

O resultado do teste de Shapiro-Wilk aponta que a maioria das variáveis apresentou distribuição normal de seus dados. Apenas as variáveis um, seis e oito apresentaram um p-valor <0,05 nesse exame, o que indicaria que sua distribuição de dados não é normal, e talvez tornasse mais adequado o uso de outro teste. Porém, foi considerado aqui uma maior amplitude no que tange o uso do teste-t, com a presença de referências que apontam que o mesmo pode ser adequado a despeito da distribuição dos dados11.

A média de pontuação somando os nove fatores analisados foi de 21,97 pontos na escala Likert pré-cartilha, considerando todos os 33 participantes; e de 28,13 pontos pós-cartilha considerando os 15 que responderam ao questionário novamente, uma melhora de 6,16 pontos na média. Restringindo a análise aos 15 que tiveram seguimento, a melhora média foi de 4,73 pontos no total, que é corroborada por um p-valor = 0,002 em um intervalo de confiança que rejeita a possibilidade de não haver diferença real, na medida em que não abarca o valor “1” frente a um teste-t pareado comparando as pontuações antes e depois da cartilha.

Considerando a significância estatística a ser definida como um p-valor <0,05 os critérios 1, 4 e a avaliação global, aqui chamada de “soma dos critérios”, foram significativas. Conforme apontado pelos gráficos box-plot a seguir, todas as mudanças foram no sentido de melhora no desempenho do questionário (Figuras 1 a 3).

Figura 1. A mudança da distribuição de pontuações pós-cartilha na variável

Figura 2. A mudança da distribuição de pontuações pós-cartilha na variável.

Figura 3. A mudança da distribuição de pontuações pós-cartilha na soma das variáveis analisadas.

Os demais critérios analisados apresentaram melhoras na pontuação média após a leitura da cartilha, contudo não se mostraram significativamente estatísticos após o teste-t pareado (Tabela 2).

Tabela 2. A relevância estatistica da mudança de pontuação dos pacientes

 t-valorp-valorDiferença das médiasIntervalo de Confiança
Critério 1-2,5780,0210,4695% (0,14-1,58)
Critério 2-1,870,0820,495% (0,06-0,86)
Critério 3-1,6050,130,4695% (0,16-1,08)
Critério 4-4,83<0,0011,495% (0,77-2,02)
Critério 5-1,590,1350,5395% (0,19-1,25)
Critério 6-0,6750,510,295% (0,43-0,83)
Critério 7-1,540,140,6695% (0,26-1,60)
Critério 8-0,4340,670,0695% (0,26-0,39)
Critério 9-0,8440,410,2695% (0,41-0,94)
Soma dos Critérios  -0,371  0,002  4,73  95% (2,00-7,46)

A evolução pós-cartilha também pode ser observada por meio das médias, medianas e distribuição por quartis considerando todos os critérios (Tabela 3).

DISCUSSÃO

Os resultados obtidos apontam que houve um aumento global do conhecimento dos pacientes sobre a DVC após a leitura da cartilha. Os pacientes que leram a cartilha, pontuaram em média 4,73 pontos a mais na escala Likert comparado ao desempenho antes do material (p-valor = 0,002). Desse modo, a cartilha pode ser avaliada como um método de ensino prático e barato para pacientes que saibam ler e demonstrem interesse pelo material.

É interessante observar que apesar dos homens serem a minoria dos entrevistados, os mesmos representaram a maioria do grupo que abandonou a pesquisa, e todos por não terem comparecido à consulta de retorno agendada, isso reforça a hipótese de que pessoas do sexo masculino procuram menos os serviços de saúde12. Tamanha discrepância entre o número de pessoas de cada sexo que participaram da pesquisa impede uma análise mais acurada acerca da diferença de desempenho entre os mesmos, já que os homens representaram menos de 15% dos participantes incluídos na análise estatística.

Considerando os artigos encontrados na revisão bibliográfica direcionada, apenas uma referência menciona pacientes com qualquer classificação clínica da CEAP13, na medida em que a imensa maioria dos programas educacionais é direcionada para portadores de úlcera venosa ativa ou cicatrizada (C5-C6). Tal fato aumenta a relevância do presente estudo, por potencialmente representar uma saída para evitar piores desfechos em decorrência das varizes de membros inferiores.

A melhora do grau de conhecimento sobre a DVC por meio de cartilhas pode ser eficaz na realidade brasileira e permite que o modelo possa ser ampliado para outras doenças vasculares, bem como para a realidade de outros países, tendo em vista que apenas uma referência anterior analisava a melhora de conhecimento exclusivamente por meio da cartilha14. O papel desse tipo de material pode ser ampliado quando empregado conjuntamente com outras intervenções educacionais, a exemplo de vídeos ou palestras com profissionais treinados, método que foi empregado em estudos anteriores13,15. É importante destacar que a cartilha criada para esse projeto já apresentava um avanço neste sentido ao empregar um QR code, que baixava um arquivo no celular do leitor ajudando a elucidar a possível evolução da DVC, tornando o processo de aprendizado mais dinâmico. A melhora do desempenho nos critérios 1 e 4 pode ser traduzida pela grande importância que o conhecimento sobre os fatores de risco e como prevenir doenças tem para a população em geral, na medida em que são muito palpáveis para a mudança de hábitos.

O foco em prevenção terciária é uma tônica nos trabalhos encontrados na revisão bibliográfica deste estudo, pois grande parte dos artigos tratam sobre a redução na recidiva de úlceras venosas por meio da educação terapêutica15-

18. Em todos eles, os métodos de ensino resultaram em melhor conhecimento e redução da recidiva. Essa análise que envolve também a clínica da DVC se mostra pertinente, sendo uma possível ampliação futura do presente trabalho.

O critério 1, que diz respeito aos fatores de risco para DVC, demonstrou evolução com significância estatística (p- valor = 0,021). Uma hipótese para essa evolução é a presença de ilustrações na cartilha que facilitam a memorização dos fatores de risco para a doença. Semelhante análise foi encontrada apenas em um artigo dentre aqueles revisados, porém, a publicação de Baquerizo15 não mostrou diferenças relevantes estatisticamente no desempenho pós- intervenção.

O critério 2 abordava o conhecimento dos pacientes sobre os sinais e sintomas da doença. A evolução dos pacientes após a leitura da cartilha foi discreta, porém esse fator conta com a nuance de apresentar alta pontuação pré- intervenção (média de 3,42 pontos na escala Likert). Essa alta pontuação pode ser explicada pela facilidade de se identificar visualmente os sinais da DVC e também pela amostra ser constituída apenas por pacientes acometidos pela doença. Novamente, o presente estudo encontra paralelo com a publicação de Baquerizo15. Porém, nessa publicação, houve uma diferença maior pós-intervenção, tendo em vista uma pontuação mais baixa no conhecimento prévio dos voluntários.

O critério 3 abordou de forma ampla como o tratamento das varizes poderia beneficiar os pacientes. A diferença pós- cartilha não foi significativa considerando tanto valores absolutos (diferença nas médias de 0,46) quanto relativos.

Porém, aqui vale uma análise sobre a importância social e estética desta doença. Durante as entrevistas, alguns pacientes mencionaram sofrer com discriminação pelas veias varicosas ou terem vergonha de utilizar determinadas vestimentas por causa do aspecto de suas pernas. Essa nuance encontra abordagem em trabalhos como o de Carpentier13, que, por meio de educação terapêutica e tratamento em um spa, estudaram a evolução da qualidade de vida dos pacientes após as intervenções, a ser medido pelo já validado CIVQ-2 score, e encontraram uma correlação entre conhecimento e bem-estar com relação às varizes.

O critério 4 buscou analisar o conhecimento dos voluntários acerca da prevenção da DVC e, assim como o critério 1, obteve uma melhora de desempenho significativa estatisticamente (p-valor < 0,001). A justificativa para uma melhora representativa encontra paralelo com o critério 1, afinal, essa era outra pergunta que encontrava na cartilha, respostas por meio de ilustrações. Uma reflexão é que, em um país onde a população tem menos anos de estudo quando comparado a países mais desenvolvidos, a imagem talvez tenha impacto maior sobre a absorção do conhecimento. Essa valorização da educação não escrita a respeito da DVC já encontrou paralelo no estudo de Baquerizo15, contudo o mesmo não conseguiu comprovar que ensinar aos pacientes por outros meios seria melhor do que por material escrito. Esse resultado talvez fosse diferente na realidade brasileira com pacientes, na média, apresentando menos anos de educação.

O critério 5 se referia a como o paciente deve coordenar seu tempo de atividade e de repouso. Essa pergunta, por vezes, causou confusão nos entrevistados e se sobrepõe em parte às medidas de prevenção. Porém, em números absolutos quanto à diferença das médias, foi a terceira dentre as nove perguntas com maior diferença pós-cartilha. Miller26 analisou a fundo esse aspecto, no entanto, após sua intervenção educacional, não houve diferença estatística no hábito de praticar exercícios para panturrilhas ou elevar as pernas dentro de 13 semanas. Uma visão interessante a respeito desse critério é o fato de o exercício físico estar muito atrelado à saúde no contexto brasileiro, isso é notável durante a entrevista dos pacientes, que recorrentemente se referiam às caminhadas como algo a ser feito para cuidar das varizes. A relação entre varizes e trabalho por longas horas em ortostatismo também era muito mencionada pelos entrevistados.

O critério 6 tratava das medidas para controle dos sintomas na DVC. Talvez, esse seja um dos critérios mais relevantes para a rotina do paciente, contudo foi o segundo que menos apresentou mudança no desempenho pós- cartilha. Uma forma de analisar esse mau desempenho pode se dar pelo fato da cartilha descrever medidas gerais, como medicação ou prática de meditação. Essas práticas tendem a ser mais difíceis de lembrar por serem menos específicas para a doença.

O critério 7 perguntou sobre as medidas de rotina para tratamento da DVC e foi o segundo que mais mudou positivamente o desempenho dos pacientes após a cartilha em valores absolutos, mas não obteve relevância

estatística. Ainda assim, o paralelo entre esse critério e o quarto deve ser traçado, na medida em que ambos são muito semelhantes ao abordar aspectos da prevenção e manejo das varizes. A despeito das diferenças com significância estatística, a boa evolução pós-intervenção de ambos pode ser correlacionada.

O critério 8 se tratava de uma pergunta ampla sobre o papel de um paciente no tratamento. Ao longo das entrevistas, essa pergunta se mostrou de difícil execução, por ser muito ampla e não apresentar respostas na cartilha. O aspecto de autorreflexão gerado pela pergunta é considerado por essa publicação como relevante, contudo deveria ter sido melhor abordado na cartilha.

O critério 9 diz respeito aos recursos necessários para um tratamento adequado. A diferença pós-cartilha não foi significativa, ainda que isso tenha sido mencionado ao longo do texto, mas a DVC representa um grande gasto em saúde, chegando a 2-3 bilhões de dólares no sistema de saúde americano, ao ano19. O tema apresenta tamanha relevância que seria razoável traçar uma pesquisa para avaliar o impacto financeiro que os materiais para tratamento das varizes causam no orçamento de pacientes do SUS.

Quanto ao objetivo secundário deste estudo, que seria identificar eventuais pontos de enfoque dos profissionais de saúde sobre a educação de pacientes com varizes, a análise de resultados aponta que a prevenção é uma zona de grande interesse, como anteriormente citado, bem como o conhecimento dos fatores precipitantes.

As limitações deste estudo surgiram em grande parte pelo componente de aprendizado pessoal que o mesmo carrega por ser um trabalho de conclusão de curso. Será importante ampliar o número de voluntários e aprofundar as análises estatísticas. A classificação CEAP dos pacientes pode ser um dado relevante de modo a propiciar uma eventual correlação entre o interesse do paciente e o respectivo grau de acometimento pela doença.

CONCLUSÃO

A cartilha se provou como um método eficaz para aumentar o conhecimento dos pacientes sobre a DVC no contexto brasileiro de saúde. Por representar um custo baixo com grande capacidade de ampliar o autocuidado de pacientes, poderia ser mais empregado no SUS. Dessa forma, sua relevância ficou evidente na medida em que é pioneira no cenário brasileiro para uma doença muito prevalente, porém que ainda não havia sido devidamente estudada como área de intervenção educacional como outras. Ainda que a educação dos pacientes seja o objetivo fundamental deste trabalho, a ampliação da pesquisa quanto ao tempo de acompanhamento dos pacientes, bem como a capacidade de gerar impacto clínico a longo prazo, seria de grande importância para o SUS.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988. Guerra A. LEI No 8.080 [Internet]. Sep 19, 1990. Available from: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8080.htm

Maffei FHA, Magaldi C, Pinho SZ, Lastória S, Pinho W, Yoshida WB, et al. Varicose veins and chronic venous insufficiency in Brazil: Prevalence among 1755 inhabitants of a country town. Int J Epidemiol. 1986;15(2):210-7. Prefeitura lança programa de tratamento de varizes graves que dispensa cirurgia [Internet]. www.rio.rj.gov.br. 2018 [cited 2023 Jan 20]. Available from: http://www.rio.rj.gov.br/web/guest/exibeconteudo?id=7949785

Primeira conferência internacional sobre promoção da saúde. Carta de Ottawa [Internet]. 1986 Nov. Available from https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/carta_ottawa.pdf

Paulo Freire. Pedagogia do Oprimido. Paz E Terra; 2005.

Almeida ER, Moutinho CB, Leite MT de S. A prática da educação em saúde na percepção dos usuários hipertensos e diabéticos. Saúde em Debate. 2014;38(101).

Correia JC, Waqas A, Aujoulat I, Davies MJ, Assal J-P, Golay A, et al. Evolution of therapeutic patient education: A systematic scoping review and scientometric analysis. Int J Environ. Res. Public Health. 2022;19(10):6128.

Osmarin VM, Bavaresco T, Lucena A de F, Echer IC. Indicadores clínicos para avaliar o conhecimento de pacientes com úlcera venosa. Acta Paulista de Enfermagem. 2018;31(4):391–8.

Vieira PC. T-Test with Likert Scale Variables. SSRN Electronic Journal. 2016.

Hanusz Z, Tarasińska J. Normalization of the Kolmogorov–Smirnov and Shapiro–Wilk tests of normality. Biometrical Letters. 2015;52(2):85–93.

Gomes R, Nascimento EF do, Araújo FC de. Por que os homens buscam menos os serviços de saúde do que as mulheres? As explicações de homens com baixa escolaridade e homens com ensino superior. Cadernos de Saúde Pública. 2007;23(3):565–74.

Carpentier PH, Satger B, Sandrin B. Patient education in spa resorts: Experience from a french national program for patients with chronic venous insufficiency. Int J Environ Res Public Health. 2022;19(3):1176.

Protz K, Dissemond J, Seifert M, Hintner M, Temme B, Verheyen‐Cronau I, et al. Education in people with venous leg ulcers based on a brochure about compression therapy: A quasi‐randomised controlled trial. Int Wound J.

2019;16(6):1252-1262.

Baquerizo Nole KL, Yim E, Van Driessche F, Lamel SA, Richmond NA, Braun LR, et al. Educational interventions in venous leg ulcer patients. Wound Repair Regen. 2015;23(1):137–40.

Miller C, Kapp S, Donohue L. Sustaining behavior changes following a venous leg ulcer client education program. Healthcare. 2014;2(3):324–37.

González A. Education project to improve venous stasis self-management knowledge. J Wound Ostomy Continence Nurs. 2014;41(6):556–9.

Shanley E, Moore Z, Patton D, O’Connor T, Nugent L, Budri AM, et al. Patient education for preventing recurrence of venous leg ulcers: a systematic review. J Wound Care. 2020;29(2):79–91.

Berti-Hearn L, Elliott B. Chronic venous insufficiency. Nursing. 2019;49(12):1.